Diz-se que vivemos em mundo da imagem, mas parece que não se sabe mais olhar. No museu as pessoas apelam para tudo para entender o que não olham diretamente: legendas e textos de toda espécie. Assim, como a particularidade física e plástica da imagem passou a importar menos que o discurso, a China montou exposição em que reproduções de pinturas famosas falam e se explicam.
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31
Jan 09
Weingart: arquitetura e tipografia
Montagem de imagens extraídas do livro Typography de Wolfgang Weingart
O tipógrafo suíço Wolfgang Weingart seguindo a tradição construtiva na tipografia, retomaria, nos anos sessenta, a observação sobre a arquitetura clássica. Mas, desta vez, ele não buscaria a precisa harmonia estrutural destas construções e sua simplificação final em linhas horizontais e verticais. Ele abandona o conceito dado a essas obras e, lança um olhar especulativo sobre a superfície, observando suas desfigurações, suas pequenas modulações, suas texturas. O interesse se volta ao estado de ruína, aos fragmentos resultantes das diversas ações do tempo.
Weingart investigava a passagem da composição mecânica à fotocomposição, da impressão tipográfica (relevo) ao offset (plana). A tipografia caracteriza-se pelo espaçamento fixo, pelo absoluto controle da disposição dos elementos e pela regularidade dos tipos, já o offset pela possibilidade, em função da planificação de todos os elementos que integram a página, de uma de interação complexa e plástica entre texto e imagem. No offset a imagem é dissolvida em reticulas e recomposta por interpolações dos pontos. Não por acaso as paisagens traduzidas por Weingart em tipografia são templos e cidades em processo de dissolução, ou os espaços pueris dos desertos, que se movimentam a cada lufada de vento.
No bojo das tradições do estilo internacional Weingart operou a desconstrução da tipografia e dos paradigmas da legibilidade.
17
Oct 08
Machado de Assis e a questão do Livro
A imagem de Machado de Assis esteve, no mês de setembro, nas capas de algumas das principais revistas do país e, em posição tão destacada nas bancas quanto as meninas da hora.
No Brasil passamos, impreterivelmente, nas escolas por alguns dos seus livros. O que faz o escritor merecer a mesma popularidade de nossas voluptuosas meninas. Machado de Assis problematizou como poucos a escrita e o livro.
O romance Memórias póstumas de Brás Cubas (1881) de Machado de Assis, retrata o ambiente de ócio e sadismo que prevalece junto a elite escravocrata do século XIX. Filho desta elite Brás Cubas é uma espécie de flaneur recriminado por levar vida mundana, não se casar e não se fazer político como quer o pai. A mentira dos valores sociais vigentes é revelada pelo próprio pai; “Olha que os homens valem por diferentes modos, e que o mais seguro de todos é valer pela opinião dos outros homens”.
Machado de Assis chama a todo tempo o leitor à materialidade da inscrição despertando-o de sua relação intensa com a trama. Põe em questão o livro como totalidade, do mesmo modo em que o revela como dispositivo. O autor conjuga, na construção do texto, elementos verbais e visuais e, interrompe freqüentemente o fluxo do texto para interpelar o leitor e convocá-lo a observar as questões do livro em processo. A partir de acidentes gráficos e apartes interrompe-se o desenrolar sucessivo de sentido revelando-se a opacidade da superfície do texto e as estratégias e dúvidas na concepção do livro. No capítulo XLIX, Machado parece ironizar diretamente os ideais de transparência do dispositivo:
“Nariz, consciência sem remorsos (…) Sabe o leitor que o faquir gasta longas horas a olhar para a ponta do nariz, com o fim único de ver a luz celeste. Quando ele finca os olhos na ponta do nariz, perde o sentimento das cousas externas, embeleza-se no invisível, apreende o impalpável, desvincula-se da terra, dissolve-se, eteriza-se. ”
Machado impõe ao leitor a consciência de que tem em mãos um livro. Ele desconstrói o caráter ao mesmo tempo reflexo e cristalino conquistado pela tipografia clássica nos quais as alternâncias de contraste entre o preto e o branco matizam e engolfam o leitor pelas luminescências e o colocam num espaço virtual quase metafísico, em estado de suspensão. O escritor abandona preceitos que sustentam a fluidez da leitura e rompe com as regras clássicas da arte de escrever que se apresentavam puramente a serviço do conteúdo.
Por outro lado, suas interrupções na narrativa se apresentam como estratégia para manter o texto vinculado a idealidade do significado, ou seja, quer o autor que a comunicação escrita, fixada em um suporte material, não fuja ao seu controle. Atua, para tanto, com eventuais “explicações” e se previne inclusive das incompreensões do crítico, como é o caso do capítulo CXXXVIII intitulado A um crítico. Sob esta ótica pode-se dizer que Machado de Assis compactua com as preocupações expostas por Platão em Fedro no qual tece críticas à escrita por seu caráter de perenidade e de exterioridade. O melhor, afirmara Platão, seria ensinar e aprender oralmente, através do diálogo, podendo o mestre escolher o seu discípulo e estar presente com condições de controlar e esclarecer os seus discursos e promover a verdade nas almas. Machado, no entanto, vem exercer a vigília sobre o significado do exposto, compondo o diálogo não pela oralidade, mas pela descrição da leitura e pela materialidade do traço.
Os cortes na seqüência, põem em causa o lugar do capítulo no todo. Haroldo de Campos afirmou, num jogo de palavras, que o principal personagem de Dom Casmurro não é a Capitu é o Capítulo (1992:224). Desta questão Abel Baptista (1998) lança ampla investigação sobre como Machado de Assis coloca em questão, de modo recorrente, a noção de totalidade intrínseca ao livro. Em Machado o livro ganha caráter de prosa capitular. Memórias Póstumas tem cento e sessenta capítulos em cerca de duzentas páginas. O capítulo protagonista em Machado coloca a tensão entre os capítulos isolados e o todo, pondo em causa a idéia de linearidade, o que, segundo, Baptista, não sublinha propriamente o fragmentário, pois a idéia de totalidade permanece presente, mas sublinha a interrupção. Com freqüência Machado assiná-la a possibilidade de suprimir um capítulo, retoma outro diante da possibilidade do leitor tê-lo pulado, enfim por suspensões e interrupções destina ao leitor as possibilidades de compor o livro, mas sob a articulação e argumentação do autor.
17
Oct 08
Mundo da Imagem?
É recorrente a afirmação de que vivemos hoje no mundo da imagem. O que nos habituamos a chamar de imagens são na verdade clichês. São elementos que não existem para serem postos em questão. Visam o alcance do tipo, de respostas imediatas ou absorção subliminar.