28
Jan 08

Da caligrafia: ocidente/oriente

Rogério Camara, 2002

A invenção da imprensa não faria desaparecer a caligrafia. Ao contrário, a imprensa favoreceria o aprendizado da escrita e da leitura. O homem letrado deveria apresentar uma caligrafia de traços firmes e elegantes. Isto é causa já discutida. Mas, pelo que sugere a imagem acima, a necessidade da bela escrita não foi abandonada no mundo das imagens calculadas. Aproveito a deixa, não para justificar o proposto no lambe-lambe (que concorra ao curso quem quiser), extraído nas ruas de Vitória-ES, mas para divagar sobre o caráter visual de nossa escrita face ao oriente.

A escrita alfabética por suas características solicita a manutenção da linha durante uma seqüência de gestos até corporificar a palavra. A permanência do contato da pena sobre o papel força a estreita proximidade entre a mão, o instrumento e o suporte. Apóia-se sobre o papel. Cola-se o olho no trilho. A atenção ao espaço gráfico cede à concentração dedicada ao curso da linha. Temporalização.

No Oriente manteve-se, desde os primórdios, o uso do pincel e de outros instrumentos naturais de escrita. O calígrafo oriental, aos modos da pintura, busca a plasticidade mais pura e a relação espacial dos elementos e, diferente da pintura, a marca de cada gesto é definitiva e não pode ser velada. O domínio do pincel inicia-se no aprendizado da escrita, antes do seu uso na pintura. Os movimentos dos traços são entrecruzados e não contínuos. Na escrita oriental, cada ideograma evidencia-se como uma totalidade relativa, figurando-se no espaço. Com isso, no Oriente a caligrafia ultrapassa os limites da escrita, pois liberta o signo do sentido preciso do contexto verbal, tornando-o impreciso, equívoco, plástico. Ao final aprecia-se a composição dos elementos e as ocorrências de casualidades. Espacialização e configuração.

No Ocidente abandonou-se o pincel e outras ferramentas primárias à procura de instrumentos que possibilitassem traços mais precisos e padronizados, favorecendo a legibilidade. Os modelos que inspiram o manuscrito são as gravações em pedras. O estilete, o estilo. A rigidez do cálamo e da pena convém à formação do caractere retilíneo e esquemático. O talhe da pena é determinante na conquista do valor construtivo e consciente do desenho.