Neste mês de dezembro deixei de morar em Vitória no Espírito do Santo, onde lecionei por 6 anos na Universidade Federal. Isto me remete, com alguma nostalgia, às primeiras impressões que tive desta cidade.
Minha primeira noite na cidade foi em um Hotel com vista para a praia de Camburi. Do lado esquerdo da praia se via, ao longe no horizonte, o porto de Tubarão, que fica em um dos extremos da estrada de ferro Vitória-Minas e nele os navios são carregados de pelotas de minério. Pelotas que são produzidas numa usina localizada na área do porto a partir do minério bruto que chega de Minas. No outro extremo da praia, do lado direito, uma pequena ilhota, na qual se encontra uma pequena casa.
Vi, assim, de um lado, um cenário próximo ao de uma cidade dos tempos da era industrial no qual se evidenciava o seu principal agente de emprego e produção: no caso a Companhia Vale do Rio Doce com chaminés e grandes navios. A fumaça vindo em nossa direção indicava o sentido do vento e, mais tarde pude observar a quantidade de minério que respirávamos. Uma espécie de ato de distribuição de renda da Vale. Minério para todos!
A ilhota no outro extremo representava, por sua vez, algum isolamento ou elo com um tempo mais longínquo, com se ali estivesse quieto o Robson Crusoe.
Vitória parece ser uma cidade compacta e portátil. Algo que poderia, a qualquer momento, ser carregada pelos imensos cargueiros que se agigantam na paisagem e se colocam a duas braçadas de distância. Do mesmo modo tive a impressão de poder dar um tapa nos aviões que passavam sob minha cabeça. O eco dos portos dia e noite no coração da cidade e o ronco das turbinas dos aviões me faziam imaginar uma cidade que se projetava sempre para além dela, desarraigada. Juntava-se a isso a dificuldade de encontrar na cidade pessoas que tenham nela nascido. Em seus mais de 460 anos Vitória parecia não ter gerado filhos. Talvez por esta sensação de desterro e de falta de identidade encontremos, como por reação, reiteradamente espraiada nas páginas dos jornais locais a palavra ‘capixaba’. O lugar que me parecia sem lugar reagia sempre afirmando o seu lugar.
A escala me permitiu transitar no tempo da bicicleta e do passo. Transformar caras em rostos. Ir da massa abstrata às pessoas.