Em tempos de fluxo de bens e de pessoas alguém já deve ter imaginado, ou realizado, um mapa no qual o mundo é representado em função do tempo de transporte físico, e não do espaço. Nesse mapa as diversas regiões poderiam sofrer contrações e dilatações ao sabor das intempéries que ocasionam o fechamento de aeroportos e de vias. Ainda assim, a Europa tenderia a ser diminuta. Paris e Londres se interceptariam. Entre Londres e Nova York o oceano Atlântico se espremeria à espessura de um mar. A África seria enorme. Algumas cidades seriam afastadas de suas visinhas. Outras apareceriam fora de seu país, ficando isoladas e reservadas àqueles que voam para o exótico. Afinal, quem está dentro e quem está fora?
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Olá professor, interessante essa análise. Se imaginarmos um mapa da economia, ou até mesmo do desenvolvimento da comunicação e tecnologia, no mapa do Brasil as regiões norte e nordeste estariam bem mais distantes da região sudeste. Enquanto São Paulo estaria ligada bem perto de Tóquio e Nova Iorque. Enquanto a cartografia antiga realçava o poder do Hemisfério Norte sobre o Sul. As novas cartografias exacerbam ainda mais as diferenças, desigualdades e também os interesses comuns.
Oi Marcio,
É verdade, o mundo é um só, mas os mapas são muitos. Eu mesmo imagino uma sobreposição dos mapas do tempo de transporte entre as cidades (que foi descrito acima) e entre os locais das próprias cidades. Algumas das cidades seriam mais eficientes no fluxo com outras do que no fluxo de seus espaços internos. Neste caso uma cidade poderia tocar a outra, mas seus bairros ficarem totalmente distantes um dos outros.
Eu acho que essa problemática é especialmente interessante se a gente analisar, dentro dos moldes da física, uma renovação dos vetores que são levados em consideração pelo ser humano quando o assunto é transporte ou deslocamento.
O que se aprende no segundo grau sobre a razao de proporcionalidade existente entre distancia, tempo e velocidade tem sofrido, a meu ver, nos últimos anos (principalmente pela dinamica de valorizacao do tempo como elemento fundamental na manutencao e aquisicao de capital dentro do modelo capitalista) uma total renovação de significado.
O que eu quero dizer com isso? Bem a gente sempre aprendeu que não se pode ver o tempo, tampouco vemos a velocidade do objeto. A relacao possível disso, muito ressaltada pelos pioneiros estudos da psicologia da percepção no início do século XX, sempre se deu pelo elemento distancia, ou melhor, deslocamento. Ou seja, precisa-se de, pelo menos, dois pontos de referencia para captar ou compreender o vetor de deslocamento de um objeto. Esse elemento clássico sempre esteve no centro primário da percepção do ser humano sobre viagens e transportes de cargas. Até mesmo pq dentro dos tres elementos (velocidade, tempo e distancia), este último é o único invariavel ao se considerar o deslocamento de dois pontos físicos.
A grande questão q eu acho que tem muito a ver com esse tópico é o estabelecimento do tempo como tema central da sociedade moderna capitalista (a lista de coisas a serem feitas não param de crescer, o tempo para executá-las, contudo, reduz-se abruptamente). O tempo, então, a meu ver, passa a tomar o lugar do antigo elemento distancia. A diferenca efetiva entre meios de transportes como o avião, o metro, o trem, o carro ou o ônibus, antes de ser pensada em velocidade (ainda que exista uma superficial afirmacao que “o aviao é mais rápido que o carro”), é pensada como economia de tempo. Daí que viajar de Vitória para o Rio de aviao, quando correndo bem o transporte aéreo, tornam essas capitais muito mais próximas do que a própria vitória e uma outra cidade do interior do estado do espírito santo.
A variável base dos mapas atuais começa a aparecer como o tempo, e a distancia, clássico elemento na construção de mapas, já não dá mais conta de todas as relacoes existentes nesse transporte.
Acredito que começamos a dar um novo passo quando a percepção dos elementos envolvidos num sistema de deslocamento e como vcs bem colocaram, é necessário a criação de um novo modelo sensorial (visual, tátil), para traduzir esse novo modelo perceptivo que começamos a estabelecer em nossa sociedade.
Oi cariocaufes,
Parece-me que sua proposta de mapa envolve vários pontos de vistas, tornando-o bastante complexo. É muito conhecido o texto “do rigor da ciência” de Borges que se refere a um império no qual a cartografia alcançou tal perfeição que o mapa do império recobria e coincidia pontualmente com ele. Há quem cite também casos de pessoas que se recusam a enxergar num mapa o local em que vive, pois nele não se prescreve a digital das coisas, a impressão direta, os sentidos. As identidades e indivíduos não são computáveis. O modelo sensorial se afasta de qualquer lei e por isso sua representação aparece sempre excluída de gráficos.
O mapa que aqui imaginei descreve quase que um tele-transporte, entra-se num ponto e se sai em outro. Isso me faz lembrar o mapa do metrô de Londres, que só pôde adotar modelo gráfico de um circuito elétrico por se tratar de um transporte subterrâneo e, sendo assim, não dá acesso à topografia da cidade ou a escreve de outro modo. Permita-me aproveitar esta discussão e desenvolve-la no próximo post.
Mas tem uma diferença. Nos diagramas de metrôs só existem alguns poucos caminhos possíveis, o que facilita o trabalho. O mapa que vc propõe, no meu entender, seria estruturado muito mais em rede, onde todos os pontos se ligam a todos os pontos. Se utilizássemos gráficos em duas ou três dimensões, ocorreriam muitas situações impossíveis de serem traduzidas graficamente. Talvez nesse caso só seria possível expressar a velocidade utilizando a própria velocidade como instrumento.
É verdade Ricardo, as suas observações denunciam minha precipitação ao comparar o mapa proposto com os de metrôs. No que imaginariamente proponho as velocidades de deslocamento redesenham fronteiras e espaços, que se afastam ou se aproximam de acordo com a eficiência dos meios de transportes disponíveis nos diversos locais. No caso do mapa do metrô de Londres sugere-se graficamente o deslocamento rápido pela equivalência das distâncias entre as estações, independente dos espaços da cidade. O tempo passa a ser medido por pontos de parada e, o ponto a ponto regular diz respeito à rapidez equivalente ao da energia elétrica. Isto permite simplificar e estabilizar o mapa, enquanto o aqui imaginado seria bastante complexo e inconstante, sujeito às variáveis de um verdadeiro organismo.
Rogério, acho que você vai gostar desses mapas aqui:
Global Communications Traffic Map
http://www.telegeography.com/products/map_traffic/index.php
Global Internet Map
http://www.telegeography.com/products/map_internet/index.php
Mapeamentos de fluxos de dados, relacionados com o espaço físico. :-)
Oi Mauro,
Eu não sei o que ocorreu com sua mensagem. Ela aparece aqui como excluída, houve algum erro. Lamento, pois seus conatos são sempre valiosos. Entrei nos links indicados. O mapa base é padrão o que não poderia deixar de ser, do contrário não reconheceríamos “nosso espaço”. Mas impressionante, pra variar,é a concentração de fluxo no norte. Se aquilo é desenvolvimento, estamos longe :)
o interessante dos mapas é que estes serão sempre representações do “real”, podendo partir de diferentes pontos de vista, sem se tornarem menos “verdadeiros”.
o que o rogério sugere me parece ser um mapeamento relacionado com os fluxos de informação, onde estes fossem representados na própria forma do mapa.
os mapas que o mauro mandou são interessantes como ferramenta de análise, mas ainda imagino um mapa desconectado dessa noção geográfica clássica.
de fato esse mapa seria mais parecido com uma rede de neurônios, com centros de concentração que inchariam ou esvaziariam conforme o fluxo. seria assim um mapa mais estrutural, formas que seriam preenchidas de informação, as mesmas que estariam sendo representadas na imagem final, em constante mutação.
parece coisa de filme de ficção científica… no entanto, acredito que a experiência de se olhar para um mapa desses possa ser algo próximo a olhar as ondas do mar.